E deu-se que acabei a terapia que nos direciona para acalmar o medo de viajar de avião. A psicóloga não pode fazer milagres, resolver minha questão depende basicamente de mim mesma.
E ainda não decidi se vou enfrentar um voo longo um dia.
Os assuntos se cruzaram e acabei me entendendo um pouco melhor.
Ou melhor, acabei de entender que sou como sou e só depende de mim ser diferente.
Não depende de mais ninguém, nem de nada externo. O que nos ameaça está dentro de nós mesmos. Por isso ainda vou continuar a terapia, focada em mim mesma.
Medos são paralizadores, castradores, frustadores de desejos.
E ninguém é responsável por nossa felicidade. Não podemos dar ao outro esse peso.
Meu medo de avião está relacionado diretamente à minha vida.
Quem passa a vida com medos, transfere para pessoas ou objetos os seus problemas.
Como entender que um medo possa nos privar de alegrias? De conhecimentos, descobertas, prazeres?
Sempre fui movida a medo. Talvez pelo fato de sempre me sentir sozinha, não no sentido de falta de companhia, mas no sentido de estar comigo mesma e não querer que invadam a minha vida.
Crescer numa grande família é meio estranho, imagina 10 filhos numa casa, um pai que cumpria seu papel de provedor e uma mãe que comandava tudo com garra, retidão e voz de comando.
Um verdadeiro quartel, com regras, ordens e sem tempo para lazer, pois as urgências eram muitas.
Mas até onde a família pode ser "culpada" por nossas vidas?
Cadê a bravura de lutar por nós mesmos e nos tornarmos donos do nosso destino? Porque uns conseguem e outros não?
Não acho que o que sou seja fruto da minha criação. Óbvio que geneticamente tenho muito do meu pai e da minha mãe. Claro que repeti muito suas vidas, muito mais no que foi bom do que no que foi ruim para mim.
Estou cansada de ter medos. Plantada no mesmo lugar, sem coragem para muita coisa.
E muito corajosa para outras. Mais ou menos assim:
"Com licença poética
Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
-- dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou."
Adélia PradoQuando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
-- dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou."
Acho que só me sentirei livre no dia em que conseguir me vencer.
Às vezes gosto de escrever meio sem sentido, mas entendo perfeitamente o que quero dizer.